O local onde você reside tem uma importante influência sobre a qualidade da sua saúde e principalmente a do seu coração, é o que tem comprovado um número crescente de trabalhos científicos. Assim como as condições dentro de cada casa têm implicações importantes para a saúde, as condições nos bairros em que se vive também podem ter efeitos tremendos sobre a saúde.
Academia ao ar livre em bairro de Maceió. Opções para prática esportiva disponíveis para a população.
Nos últimos 20 anos tem havido um interesse emergente no impacto dos bairros na saúde. Esta tendência crescente baseia-se no reconhecimento da necessidade de considerar não apenas as características e comportamentos individuais, mas também o contexto em que os indivíduos vivem quando tenta-se compreender as variações da saúde e da doença entre os grupos da população, mesmo após ajustes epidemiológicos para fatores individuais.
As características sociais e econômicas dos bairros têm sido relacionadas à mortalidade, ao estado geral de saúde, ao parto, às condições crônicas de saúde, aos comportamentos de risco e outros fatores de risco para doenças crônicas, bem como à saúde mental, lesões, violência e cada vez mais as doenças cardiovasculares.
Em uma análise da renda familiar e da mortalidade em um período de quinze anos nos Estados Unidos, a expectativa de vida para os indivíduos no quarto mais baixo de renda variou substancialmente entre as áreas locais em até quatro anos e meio anos. Algumas comunidades foram claramente mais bem sucedidas em cuidar seus cidadãos mais pobres, e compreender os componentes que importam é um desafio para pesquisadores e formuladores de políticas em todo o mundo. O que mostra que mesmo em bairros com níveis sócio econômicos semelhantes existem fatores que intrínsecos ao bairro que alteram o processo saúde-doença.
Quadra de futebol em comunidade carioca. A presença de locais para prática esportiva, mesmo em bairro de baixo nível sócio-econômico podem impactar positivamente a saúde da população.
Estudos recentes usaram grandes conjuntos de dados e vincularam esses dados a variáveis de bairro baseadas no censo, usando códigos postais individuais para avaliar a importância da renda familiar média, porcentagem de graduados do ensino médio e composição racial / étnica como preditores de resultados de saúde.
Grande parte do foco da pesquisa de bairros em doenças crônicas tem sido sobre doenças cardiovasculares, diabetes mellitus e obesidade, uma vez que o acesso deficiente a alimentos saudáveis e oportunidades limitadas para a atividade física estão relacionados a aspectos físicos potencialmente relevantes para a saúde.
Estudos recentes mostram uma associação entre medidas de nível socioeconômico e resultados para pacientes com insuficiência cardíaca. Contudo, não foi esclarecido se o nível socioeconômico ou o perfil da vizinhança tem um efeito primário ou é um marcador para nível socioeconômico individual.
Quando analisada a insuficiência cardíaca, o nível socioeconômico da vizinhança foi significativamente associado com a readmissão de todas as causas de seis meses, mesmo após ajuste para outros fatores do paciente, incluindo o nível socioeconômico individual. Contudo, ainda é necessário um maior número de eventos e um acompanhamento mais longo para determinar o efeito potencial do nível socioeconômico da vizinhança na mortalidade.
A facilidade em andar na vizinhança, por exemplo, foi associado positivamente com a atividade física dos residentes e negativamente com medidas da obesidade e do diabetes. As associações com outros fatores de risco cardiovascular, como a hipertensão, têm sido menos consistentes.
A dificuldade de transitar livremente pelo bairro e a ausência de locais para prática de esporte podem impactar negativamente a saúde dos moradores de todo um bairro.
A presença de áreas verdes e parques, espaços seguros para caminhar, como calçadas mantidas, lojas de alimentos com frutas e legumes frescos, locais recreativos para esportes e atividade física e segurança pessoal razoável contra a criminalidade têm todos. Avaliar a qualidade dos bairros. Estes podem ser obtidos a partir de dados do censo ou, mais recentemente, de conjuntos de dados de geográficos que incorporam imagens de satélite. Estas medidas podem também ser obtidas por auto-informação dos residentes quando arguidos em questionários.
A disponibilidade de feiras livres de bairro é um dos fatores que podem impactar a saúde cardiovascular da população.
No contexto brasileiro, a segurança para realização de atividades físicas em espaços públicos apresenta-se gradativamente como um fator a ser ponderado. Diversos episódios de violência a atletas profissionais e amadores se multiplicaram nos últimos anos, mesmo em bairros com alto nível sócio econômico. Além é claro das óbvias dificuldades de planejamento urbano e as desigualdades sociais que permeiam a sociedade brasileira. Cabe não só aos gestores e formuladores de políticas públicas, como também a toda sociedade encontrar soluções para melhor a qualidade de vida em seu bairro e a saúde de todos os moradores destes.
Referências:
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