O desenvolvimento tecnológico dos métodos de imagem não invasivos permitiram, nas últimas décadas, um grande avanço no diagnóstico e tratamento das doenças cardiovasculares. Entre eles, a coronariografia e a angiotomografia têm proporcionado maior segurança na indicação da conduta médica para os pacientes. Em algumas situações, porém, esses exames possuem algumas limitações, principalmente no caso da estenose moderada de artérias coronárias. Nessa situação, o Fluxo Fracionado de Reserva do Miocárdio (FFR) mostra-se de grande valia para avaliar a significância de lesões arteriais ao miocárdio, auxiliando assim na melhor indicação terapêutica.
Por definição, FFR é a razão entre o fluxo sanguíneo máximo para o miocárdio na presença de uma estenose e o fluxo arterial na ausência de estenose. Ou seja, o FFR representa a fração do fluxo sanguíneo máximo que poderá ser distribuído para aquela região do miocárdio,apesar da presença da estenose arterial (1). Sabemos que fisiologicamente a microcirculação coronariana é capaz de promover vasodilatação em resposta a situações de maior demanda, aumentando assim o fluxo sanguíneo para o músculo cardíaco. Quando ocorre isquemia, esse mesmo mecanismo ocorre na tentativa de manter as necessidades fisiológicas do miocárdio. Entretanto, medir esse fluxo é tecnicamente difícil, e nesses casos o FFR pode ser uma ferramenta útil.
Essa significância funcional do FFR é capaz de determinar as características do fluxo arterial que se localiza distalmente à lesão e compará-lo com as características do fluxo arterial proximal à lesão, utilizando a hiperemia máxima, que é o fluxo sanguíneo máximo estimulado por drogas como adenosina e papaverina. O teste pode ser realizado durante a coronariografia, com um cateter-guia que é conectado a um aparelho de análise de pressões em sua extremidade, capaz de detectar os níveis pressóricos. O valor do FFR é obtido com a divisão da pressão média distal à estenose (Pd) pela pressão proximal (Pa) durante uma vasodilatação induzida por papaverina ou adenosina (2).
Em teoria, o valor normal é de 1 para pacientes e artérias saudáveis, pois essas artérias não fazem resistência ao fluxo sanguíneo coronariano. Porém, um FFR de 0,50, por exemplo, demonstra que a quantidade máxima de sangue que irriga aquela área específica do miocárdio atinge apenas 50% do que atingiria se a artéria não estivesse com uma obstrução. Por isso, podemos medir a pressão no interior da artéria para então estimar o fluxo sanguíneo para aquela área do miocárdio. Quando uma estenose é significativa, o fluxo/pressão pós-estenose são é menor que na área pré-estenose, mesmo com a dilatação máxima da artéria coronária.
Valores superiores ou iguais a 0,80 podem receber tratamento conservador, enquanto valores inferiores a 0,80 demonstram que a placa está causando limitação de fluxo e é sinal de isquemia miocárdica; nesses casos, os pacientes podem ter benefício com a revascularização percutânea ou cirúrgica (1,3).
Nesse cenário, o FFR mostra-se um instrumento de grande valor para avaliar a perfusão miocárdica, principalmente em casos de lesões moderadas em que não há certeza da presença de isquemia e dúvida sobre a conduta médica; apesar de possuir algumas limitações (casos de hipertrofia ventricular esquerda e presença de artérias calcificadas), o FFR ainda é um importante auxílio na avaliação e decisão da melhor conduta terapêutica para o paciente,de forma eficaz e individualizada.
REFERÊNCIAS:
1. Jeremias A, Kirtane AJ, Stone GW. Fractional Flow Reserve: Accuracy, Prognostic Implications, and Limitations. J Am Coll Cardiol. 2017;69(22):2748–-58.
2. Kern MJ, Samady H. Current Concepts of Integrated Coronary Physiology in the Catheterization Laboratory. J Am Coll Cardiol [Internet]. 2010;55(3):173–-85. Available: http://dx.doi.org/10.1016/j.jacc.2009.06.062
3. Regina M, Makdisse P. Fluxo fracionado de reserva miocárdica −-atualização terapêutica. Educ Contin em Saúde −-Hosp Albert Einstein. 2012;8(Figura 3):140–-4.