Os riscos do barulho para o coração

Em 2017, a Organização Mundial da Saúde publicou uma revisão sistemática sobre os efeitos adversos da poluição sonora do transporte sobre o sistema cardiovascular, que infelizmente concluiu não haver estudos de qualidade suficiente para fazer esta avaliação, mas afirmando que a plausibilidade da associação clama por mais investigação.
Neste ano foi publicado um estudo de coorte por Andrei Pyko e colaboradores[1] para solucionar esta questão. O projeto avaliou o impacto do tempo de exposição prolongado ao barulho do tráfego (incluindo rodovias, trens e aviões) em relação à morbidade e mortalidade por doença arterial coronariana (DAC) e acidente vascular encefálico (AVE).
A população escolhida neste estudo foi da cidade de Estocolmo, na Suécia, e a coorte escolhida já fazia parte de outros estudos longitudinais, ou seja, já é uma população controlada. Para avaliar a exposição sonora, foi utilizado um banco de dados que continha informações sobre a intensidade de barulho da fachada principal de cada prédio de cada um dos participantes, de 1990 a 2010, além de avaliar a densidade de prédios, fluxo de carros e trens, limite de velocidade e barulho dos dois aeroportos principais de Estocolmo. Surpreendentemente, caso o participante se mudasse durante o período de estudo, o nível de barulho seria recalculado para o novo endereço. No total, foram 20.012 indivíduos incluídos com dados completos, com idade média de 60 anos (variando de 35 a 104 anos), o que forneceu um total de 245.000 pessoas-ano para observação.
Nos resultados, foram registrados 1.363 eventos de DAC e 902 de AVE, incluindo 286 e 113 eventos fatais, respectivamente. No começo, 39% das pessoas foram expostas a um tipo de transporte com 45 dB (a medida realizada utilizou uma conversão para densidade de barulho, desse modo, o valor obtido não é o valor bruto medido pelo banco de dados), pelo menos 22% foram expostas a dois tipos de transporte, 1% aos três tipos de transporte e 38% foram expostos a níveis menores que 45 dB.
A análise estatística revelou significância apenas para barulho de carros e avião com incidência de DAC em mulheres, HR de 1,11 (IC 95% 1,00-1,22) e 1,25 (IC 95% 1,09-1,44) para cada 10 dB, respectivamente. Para homens, houve significância apenas para barulho de carros. Em relação ao AVE, houve significância estatística apenas entre barulho de carros e mulheres. Quando o indivíduo foi exposto aos três tipos de barulho simultaneamente, houve um HR de 1,57 (IC 95% 1,06-2,32) para DAC (Figura 1).
Apesar dos resultados, após a análise, o estudo concluiu que não há evidência clara e consistente o suficiente da relação entre poluição sonora dos transportes com a incidência de DAC e AVE. Entretanto, parece haver um risco maior de DAC em mulheres expostas ao barulho de carros ou aviões. Ademais, a exposição simultânea aos três tipos de ruído parecia ser particularmente prejudicial.
Figura 1. HR da incidência de DCA e AVE em relação ao número de fontes de exposição ao ruído de transporte ≥45 dB, 1-5 anos anteriores ao evento em modelo totalmente ajustado (ajustado por sexo, ano de arrolamento e ano do evento, tabagismo, consumo de álcool, nível de escolaridade, atividade física durante o tempo de lazer, estado civil e situação de trabalho, com a idade como escala de tempo).
Referência
Pyko A, Andersson N, Eriksson C, de Faire U, Lind T, Mitkovskaya N, et al. Long-term transportation noise exposure and incidence of ischaemic heart disease and stroke: a cohort study. Occup Environ Med. 2019;0:1-7. doi: 10.1136/oemed-2018-105333.
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