O ponto esquecido no coração que iniciou uma revolução na cirurgia cardiovascular

Em 1949, Arthur B. Voorhees Jr. era um jovem e promissor residente da Universidade de Colúmbia. Muito ligado ao renomado Dr. Blakemore, ele trabalhava em seu laboratório em um projeto para a criação de uma nova prótese de válvula mitral. Durante um dos implantes dessas novas válvulas, uma sutura de seda foi inadvertidamente deixada dentro do ventrículo esquerdo.

Dr. Arthur Voorhees em seu laboratório, com um dos animais usados em seus experimentos.

Quando o animal utilizado no experimento foi sacrificado, verificou-se que o fio da sutura estava envolto por uma membrana escorregadia que lembrava o endotélio dos vasos sanguíneos. A surpreendente observação levou Voorhees a indagar se um tecido exposto à corrente sanguínea desenvolveria uma camada semelhante.

Encorajado pela ideia, ele usou a máquina de costura de sua mulher para produzir um tubo de Vinyon (tecido semelhante à seda cedido pelo colega ortopedista James Blunt) e substituí-los pelas aortas de suas cobaias. Apesar da dificuldade de manipulação do tecido, os resultados iniciais foram estimulantes: os enxertos permaneceram abertos.

A descoberta da possibilidade do uso de enxertos sintéticos seria fortuita. Naquele período já se notava que os enxertos de aortas humanas implantados não possuíam longa durabilidade. Após um ou dois anos eles degeneravam, tornavam-se aneurismáticos e tinham de ser substituídos.

Os avanços na indústria têxtil permitiram a criação dos enxertos de Dacron, mais fáceis de manusear e costurar. Com a matéria-prima sempre disponível, os enxertos poderiam ser preparados em diversas formas e tamanhos.

Esse trabalho pioneiro foi levado adiante pelo lendário cirurgião cardiovascular Dr. Michael DeBakey, que, também usando a máquina de costura de sua esposa, fabricou o primeiro enxerto de Dacron e o implantou na aorta descendente de um de seus pacientes.

Hoje, as próteses e endopróteses de aorta constituem parte fundamental da cirurgia cardiovascular e essas descobertas foram determinantes para salvar as vidas de milhares de pacientes, muitos vítimas de doenças capazes de retirar a vida deles dentro de instantes.

 

Dr. Michael DeBakey exibindo um dos enxertos de aorta produzidos por sua equipe.

Dedicação e muito trabalho foram fatores que trouxeram a cirurgia cardiovascular ao que é hoje, mas não se deve ignorar os papéis que a inspiração e até mesmo a sorte tiveram nessa jornada.

Referências

  1. Morris T. The matter of the heart: a history of the heart in eleven operations. London, United Kingdom: Penguin; 2017
  2. The Spectator. [Homepage]. [acesso em 2017 fev. 10] Disponível em: https://www.spectator.co.uk/2017/06/how-a-careless-mistake-led-to-a-breakthrough-in-heart-surgery/
  3. Peguin Random House Company. [Homepage]. [acesso em 2017 fev. 10] Disponível em: https://www.penguin.co.uk/books/1110892/the-matter-of-the-heart/
  4. Amazon.com, Inc. [Homepage]. [acesso em 2017 fev. 10] Disponível em: https://www.amazon.co.uk/Matter-Heart-History-Eleven-Operations/dp/1847923917/ref=as_sl_pc_tf_til?tag=thespe06-21&linkCode=w00&linkId=1bba3a747cce4e7528109ed54ef5d192&creativeASIN=1847923917
  5. Smith III, RB. Arthur B. Voorhees, Jr. Pioneer vascular surgeon. J Vasc Surg. [Internet]. 1993 [acesso em 10 jul. 2017];18(3):341-8. Disponível em: http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/074152149390250P
  6. Levin SM. Breakthrough: Arthur Blakemore and Arthur Voorhees, Jr. J Vasc Surg. [Internet]. 2012 [acesso em 10 jul. 2017];55(6):1829-31. Disponível em: http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0741521412000973
0

Posts relacionados